Alterações climáticas e o Homem: a questão da escala de tempo

Este texto é uma adaptação de um que foi originalmente publicado pelo Dr. Jeff Goldstein, director do National Center for Earth and Space Science Education, no seu Blog on the Universe. Goldstein escreveu este texto após algumas perguntas difíceis do seu filho menor, nomeadamente "quanto tempo são mil milhões de anos?".

Esta é uma pergunta importante pois é um problema recorrente na educação para a ciência que a maioria das pessoas não compreende períodos de tempo muito maiores que o seu tempo de vida. Não deve haver espanto, portanto, quando as pessoas não compreendem que o aquecimento global e as alterações climáticas são devidas à intervenção humana e preferem considerá-las resultado de variações naturais em longos períodos de tempo. Algo semelhante acontece com a evolução das espécies.TOPO

O Homem e o tempo

Um humano vive em média 75 anos (no ocidente), considerando a ausência de doenças como a SIDA e a disponibilidade de medicina moderna. Importantíssimo para o resto da história é o seguinte cálculo:

Em média um humano viverá 75 anos  x 365,25 dias/ano =    27394 dias de vida

Posto desta maneira, a duração de um único dia na vida de alguém é absolutamente inconsequente relativamente à duração da vida humana. Assim, se tivéssemos um diário com uma página para cada dia da nossa vida, teríamos um livro com 27394 páginas.

Se agora imaginarmos que a Terra um enorme organismo cósmico, ela terá uma expectativa de vida de cerca de 10 mil milhões de anos, desde o seu nascimento na nébula primordial à sua morte, quando o Sol morrer daqui a cerca de 5 mil milhões de anos.

Mas um diário da vida da Terra terá demasiadas folhas com este tempo de vida, por isso vamos oferecer-lhe um dos nossos, com apenas 27 mil e tal páginas. Cada página do diário da Terra corresponderá, então, a um 'dia geológico', que, tal como os nossos dias, será absolutamente inconsequente em relação ao tempo total de vida da Terra, afinal ela tem 27394 deles.

Mas atenção, cada uma das 27394 páginas do Diário da Terra, cada dia geológico, tem 365000 anos de duração, tempo suficiente para 14600 gerações humanas, o que nos deverá dar uma nova perspectiva sobre o tempo geológico em relação ao fugaz momento das nossas vidas.

Vamos então espreitar uma entrada no Diário da Terra, a descrição do dia 13697 na vida do nosso planeta.TOPO

Um dia na vida da Terra
Consulte o relógio da Terra!

O relógio da Terra está a fazer tic-tac, é tempo de agir, antes que seja tarde demais! (clique na imagem para consultar o relógio da Terra)

Querido diário,

Hoje, como sempre, vou estar atenta à minha superfície. É uma grande grande responsabilidade ser um oásis de vida no espaço imenso. Tenho muito cuidado com todas as formas de vida que vivem em mim pois elas dependem de um equilíbrio muito delicado nas condições superficiais.

O dia de hoje começou rotineiro como sempre, ainda estou a ver aquelas criaturas bípedes que notei pela primeira vez há 6 dias geológicos. Ao longo dos últimos dias parecia que havia várias espécies deles mas a meio do dia de hoje fiquei com a certeza de que só há uma espécie dominante. Estou fascinada com eles, são inteligentes e fazem ferramentas.

Bem, é tempo de acabar de escrever, já é quase outro dia geológico, restam 35 segundos geológicos (150 anos para nós humanos). Mas espera ... viram aquilo? Os níveis de dióxido de carbono na minha atmosfera dispararam! Isto não pode estar certo! De repente o dióxido de carbono está ao nível mais elevado dos dois últimos dias geológicos (800 mil anos), se calhar mesmo dos últimos 50 (20 milhões de anos)!

Isto é grave, o dióxido de carbono pode parecer inocente, as minhas formas de vida criam-no e usam-no, mas o meu vizinho Vénus tem uma atmosfera com 96% dele e tem uma temperatura superficial de 470ºC em vez dos 50ºC que deveria ter pela distância ao Sol. O dióxido de carbono é um gás de efeito de estufa e, apesar de no meu caso ser um gás vestigial, a minha biosfera está num equilíbrio delicado e um aumento substancial deste gás pode ter consequências dramáticas.

Este aumento, que ocorreu num espaço ridiculamente pequeno, é espantosa e não se deve a ciclos naturais pois nada naturalmente ocorre a esta velocidade. Esta é a definição de um evento catastrófico: à escala global de muito curta duração. Devia ser óbvio mas não vejo a sua origem, nenhuma cratera, nenhum super-vulcão ... deixa-me procurar melhor.

Espera. O que se passa agora? A temperatura disparou! A variação das temperaturas no passado recente mostra pequenas glaciações e tendências para aquecimento mas agora está a atingir um pico, uma alteração muito rápida e simultânea com a do dióxido de carbono.

Isto é terrível. Sinais de alarme vêm de todo lado: desaparecimento do gelo marinho, degelo dos glaciares, tem que haver uma causa. Algo tem que ter acontecido, algo diferente. Parece o início de uma alteração irreversível no ambiente global. Tenho que descobrir o que se passa antes que seja tarde demais para as inúmeras espécies à minha superfície. Deixa-me ver se consigo descobrir o que aconteceu ... tem que ser algo óbvio.

Espera ... são os bípedes! Oh não … estão em todo o lado, a sua tecnologia está em todo o lado, só nos últimos 35 segundos geológicos! É uma infestação! Têm que ser detidos, é suposto serem inteligentes ... se calhar não! Mas vou tentar faze-los compreender.

Hey vocês aí!! Olhem para estes dados, olhem para eles! Rápido, olhem!

O que é que estão a fazer? Parem! Estão doidos? Pensam que podem carregar a minha atmosfera com esse nível de emissões da vossa tecnologia, num piscar de olhos, e não ter impacto sobre mim? Pensam que os meus sistemas são capazes de limpar a atmosfera assim tão depressa? Os meus sistemas não trabalham em escalas de tempo de 35 segundos geológicos! ……. não há suficientes deles a ouvir-me, estão demasiado ocupados e preocupados  … com eles próprios.

Nem parecem preocupados com o facto de estarem a cometer suicídio, é a opção deles. Mas … não têm o direito de levar incontáveis formas de vida com eles. Tenho que chamar o Controlo de Pragas Interplanetário ou amanhã vai ser um dia muito mau! TOPO

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